Glosa (poema)
Glosa[1][2] é uma forma de poema utilizada que foi primeiramente registada em Português no "Cancioneiro Geral" de Garcia Resende (1536) que colecionou 880 poemas[3]. Um dos formatos é a cantiga, com um mote de quatro ou cinco versos e uma glosa de oito ou dez. Composição poética de origem peninsular, constituída por uma estrofe inicial, onde é apresentado o tema (mote), seguida por tantas estrofes quantos os versos apresentados na estrofe inicial e devendo ser estes incluídos sucessivamente, um a um, no final de cada estrofe, para desenvolvimento do tema da composição, que é sobretudo amoroso.
Lembra-se que o termo glosa é sinónimo de volta e que este possui três aceções diferentes: ora de composição poética; ora de verso, que se repete no final das estrofes que glosam o mote; ora, já numa extensão de sentido, de estrofes, que desenvolvem o tema do mote nas cantigas e nos vilancetes.
A glosa tem grande representatividade, a partir do século XV, nos cancioneiros hispânico e português[3], dos quais se destaca o Cancioneiro Geral (1516) de Garcia de Resende, sendo sobretudo desenvolvida por poetas palacianos.
Também pode ser referência a um forma usada pelos poetas do Nordeste do Brasil, principalmente os cantadores, em forma de uma ou mais décimas (estrofe de 10 versos) que respondem a um desafio, expresso em forma de mote. O mote é, geralmente, um dístico, ou seja, composto por dois versos. Esses versos se apresentam na glosa de duas formas mais comuns:
- Os dois versos aparecem no fim da estrofe, compondo a rima, que, na maioria das vezes, segue o esquema ABBAACCDDC.
- Um verso do mote aparece como quarto verso da glosa, e o outro verso na última posição. O esquema rímico é semelhante.
- Mais recentemente, o poeta Paulo Camelo criou e apresentou o que ele denominou Glosa com mote migrante, um poema com mais de uma estrofe (de duas a cinco), onde o mote, em dístico, aparece em posições diferentes, ascendendo nas estrofes das últimas para as primeiras posições.
Exemplos
[editar | editar código-fonte]Mote no final
[editar | editar código-fonte]- Mote
-
- "Devagar, como fogo de monturo,
- a saudade invadiu meu coração".
- Glosa
-
- Na fazenda, nasci e me criei,
- peraltava e fazia escaramuça,
- morcegava, no campo, a besta ruça,
- jararaca até mesmo já matei.
- Não me lembro da vez em que acordei
- assombrado com tiros de trovão,
- pinotava da rede para o chão
- e saía correndo pelo escuro.
- Devagar, como fogo de monturo,
- a saudade invadiu meu coração".
Mote em versos separados
[editar | editar código-fonte]- Mote
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- "Por esses caminhos venho
- pedaços de mim deixando".
- Glosa
-
- Nem juntos arte e engenho
- de Camões podem cantar
- como em vão a tropeçar
- por esses caminhos venho.
- O amor para mim é lenho
- que em meio aos lobos em bando,
- aos trancos vou carregando
- e a cada mulher que passa
- sou tragado na fumaça,
- pedaços de mim deixando
- ("Aos trancos e barrancos" - Zé Barreto[5]
Mote migrante
[editar | editar código-fonte]No início do século XXI, o poeta Paulo Camelo apresentou uma variação em glosa que ele denominou Glosa com mote migrante[6], um poema com mais de uma estrofe (de duas a cinco), onde o mote, em dístico, aparece em posições diferentes, ascendendo nas estrofes das últimas para as primeiras posições. No entanto, a migração, de forma mais rara, pode não seguir esse sentido, com os versos do mote aparecendo em posições diversas em cada estrofe.
- ↑ CAMPOS, Geir (1960). Pequeno dicionário de arte poética. Rio de Janeiro: Edições de Ouro. p. 93
- ↑ Porto Editora, 2003-2016
- ↑ a b ROCHA, ANDRÉE. Garcia de Resende e o Cancioneiro Geral. Amadora: Instituto de Cultura Portuguesa: Bertrand, 1979
- ↑ CAVALCANTI, Carlos (2004). Sertanidade. Recife: Ed. do antor. p. 45
- ↑ BARRETO, Zé (2002). Periscópio::Um olhar ao redor. Recife: Ed. do autor. p. 19
- ↑ CAMELO, Paulo (11 de agosto de 2012). «Se eu nunca soubesse disso». Recanto das Letras. Consultado em 26 de abril de 2023
Bibliografia sugerida
[editar | editar código-fonte]- CAMELO, PAULO. Glosas, sonetos e outros poemas. Recife: Paulo Camelo, 2004.
- CAMELO, PAULO. Mote migrante. Recife: Paulo Camelo, 2019.
- CAVALCANTI, CARLOS SEVERIANO. Sertanidade. Recife: Ed. do Autor, 2004.
- RESENDE, GARCIA. Cancioneiro Geral. Lisboa: Biblioteca Nacional de Lisboa 1536.
- glosa in Artigos de apoio Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2016. [consult. 2016-12-01 15:09:14].